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Google compra tecnologia desenvolvida por brasileiro por R$ 16,5 bi

Google compra tecnologia desenvolvida por brasileiro por R$ 16,5 bi
Em 2022, Noam Shazeer e o brasileiro Daniel de Freitas deixaram seus empregos desenvolvendo inteligência artificial no Google. Eles disseram que a big tech era muito lenta no assunto. Por isso, eles criaram a Character.AI, uma startup de chatbot, e levantaram quase US$ 200 milhões (cerca de R$ 1,1 bilhão).

Na semana passada, Shazeer e Freitas anunciaram que estavam voltando ao Google. Eles disseram que haviam feito um acordo para se juntar novamente ao braço de pesquisa em IA da empresa, junto com cerca de 20% dos funcionários da Character.AI, e fornecer à big tech a tecnologia da sua startup.

Mas, apesar de o Google estar adquirindo tudo isso, a empresa não comprou a Character.AI.

Em vez disso, o Google concordou em pagar US$ 3 bilhões (aproximadamente R$ 16,5 bilhões) para licenciar a tecnologia, disseram duas pessoas a par do acordo. Cerca de US$ 2,5 bilhões (ou R$ 13,75 bilhões) desse valor serão usados para comprar as ações dos acionistas da Character.AI, incluindo Shazeer, que possui entre 30% e 40% da empresa.

Com isso, ele pode ganhar de US$ 750 milhões a US$ 1 bilhão, segundo fontes. O restante da Character.AI continuará operando sem seus fundadores e investidores.

O acordo foi uma das várias negociações incomuns que surgiram recentemente no Vale do Silício. Enquanto as grandes empresas de tecnologia normalmente compram startups inteiras, elas têm recorrerido a uma estrutura de negócio mais complicada para empresas calouras de inteligência artificial.

Isso envolve licenciar a tecnologia e contratar os principais funcionários — efetivamente «engolindo» a startup e seus principais ativos — sem se tornar a proprietária da empresa.

O paulista Daniel de Freitas e seu sócio, Noam Shazeer, donos da Character.AI, que foi contratado pelo Google — Foto: Ian C. Bates / The New York Times
O paulista Daniel de Freitas e seu sócio, Noam Shazeer, donos da Character.AI, que foi contratado pelo Google — Foto: Ian C. Bates / The New York Times

Essas transações são impulsionadas pelo desejo das grandes empresas de tecnologia de evitar o escrutínio regulatório enquanto tentam dar passos maiores no universo da IA, disseram três pessoas que participaram desses acordos.

A Comissão Federal de Comércio (FTC) está de olhos atentos ao Google, Amazon, Meta, Apple e Microsoft, para saber se as big techs estão esmagando a concorrência, inclusive através de compra de startups.

— As grandes empresas de tecnologia podem claramente estar tentando evitar a regulação ao não adquirir diretamente essas empresas. Mas esses acordos realmente começam a parecer muito com aquisições regulares — disse Justin Johnson, economista de negócios especializado em antitruste na Universidade de Cornell, de NY.

Em comunicado, o Google disse estar «entusiasmado» com o retorno de Shazeer ao lado de alguns de seus colegas, mas se recusou a comentar sobre a situação anticoncorrencial. Na segunda-feira, 5, um juiz federal americano emitiu uma decisão histórica que concluiu que o Google violou a lei antitruste ao abusar de um monopólio no serviço de busca.

Procurado, a Character.AI se recusou a comentar o acordo.

Esse frenesi diminuiu à medida que ficou claro que algumas dessas startups de alto perfil não teriam sucesso, criando uma oportunidade para as grandes empresas de tecnologia realizarem acordos nada tradicionais.

A Microsoft deu início a essa tendência em março, quando concordou em pagar mais de US$ 650 milhões (cerca de R$ 3,5 bilhões) à startup de IA Inflection para licenciar sua tecnologia e contratar quase todos os seus funcionários, incluindo seu fundador, Mustafa Suleyman. Agora, o veterano do cenário de inteligência artificial agora lidera o negócio de IA para consumidores da Microsoft.

Em junho, a Amazon fechou um acordo semelhante com a startup Adept, contratando muitos de seus funcionários, incluindo seu fundador, David Luan.

A Amazon pagou cerca de US$ 330 milhões (aproximadamente R$ 1,8 bi) à Adept para licenciar sua tecnologia, com grande parte do dinheiro sendo usada para pagar os US$ 414 milhões (algo em torno de R$ 2,4 bilhões) que a startup havia levantado de investidores, disseram três pessoas com conhecimento da transação.

A Amazon também ofereceu um bônus de retenção de US$ 100 milhões para os funcionários da Adept que se juntaram, disseram as fontes.

Os reguladores estão atentos. A FTC está trabalhando em um estudo amplo sobre acordos de inteligência artificial entre startups e big techs como a Microsoft, Amazon e Google, disse a agência em janeiro.

Ela também está investigando se a Microsoft deveria ter notificado os reguladores sobre o acordo com a Inflection, o que teria submetido o arranjo a uma análise mais imediata.

Na última quinta-feira, 8, o regulador antitruste do Reino Unido informou que estava investigando um acordo de investimento que a Amazon fez com a Anthropic.

O Vale do Silício adotou esses acordos incomuns porque os fundadores de startups podem continuar trabalhando em sua tecnologia com os recursos de uma grande empresa, sem se preocupar em ganhar dinheiro por conta própria.

As transações também podem proporcionar um retorno rápido para os investidores. Os da Character.AI, que foi avaliada em US$ 1 bilhão, obtiveram um retorno de 2,5 vezes o valor investido depois do acordo de licenciamento com o Google . Isso apenas dois anos depois da injeção.

Nos acordos da Adept e da Inflection, a maioria dos investidores recuperou seu dinheiro. No entanto, as transações também deixaram para trás entidades corporativas órfãs, isolando funcionários restantes em startups onde os fundadores e investidores.

Só que esses funcionários não participam dos lucros financeiros desses acordos. Isso causou consternação entre alguns investidores e empreendedores do setor.

— Se você constrói uma empresa e recebe dinheiro de investidores, todas as pessoas envolvidas merecem ser recompensadas. Foi assim que o Vale do Silício surgiu. Se você diluir as coisas, será difícil para o ecossistema sobreviver — disse Sebastian Thrun, pesquisador de IA e empreendedor conhecido por fundar o projeto do carro autônomo do Google.

Matt Turck, investidor da empresa de capital de risco FirstMark Capital, disse que esperava que esse tipo de acordo não avançasse porque criava «uma estrutura confusa que quebra o alinhamento» entre fundadores, funcionários e investidores.

Não está claro como as empresas deixadas para trás vão se sair. Na Character.AI, Dominic Perella, o conselheiro geral, tornou-se o CEO interino. A startup disse que está «comprometida em atender seus usuários por meio de novos produtos inovadores».

Na Adept, as equipes que trabalham em produtos, vendas e outras áreas não se juntaram à Amazon, disse uma fonte. A Amazon contratou apenas os pesquisadores que construíram a tecnologia de inteligência artificial da Adept.

O ex-chefe de engenharia da startup, Zach Brock, assumiu o cargo de CEO. A empresa está tentando licenciar sua tecnologia para outras empresas, de acordo com uma proposta recente enviada a potenciais parceiros que foi vista pelo The New York Times.

A Inflection também contratou um novo CEO, mas apenas dois funcionários permaneceram, enquanto o restante — cerca de 70 pessoas — se juntou à Microsoft. A Inflection usou a taxa de licenciamento de US$ 650 milhões (cerca de R$ 3,6 bi) da Microsoft para reembolsar seus investidores, que haviam investido US$ 1,5 bilhão (aproximadamente R$ 8 bi) na empresa.

Mais acordos como esse ainda podem surgir. Muitas startups de IA levantaram grandes somas com metas extremamente ambiciosas, e grandes compradores continuam ansiosos para pagar pelos melhores talentos, ideias e produtos.

Ao mesmo tempo, algumas dessas startups estão lutando para ganhar dinheiro e competir com os grandes players, ou seja, podem estar mais dispostas a considerar negociações.

— Fundadores e investidores percebem que nem toda startup de IA de alto perfil com grandes fundadores vai ser o próximo OpenAI ou Google— disse Turck.